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Foto do escritorDra. Raquel Bunholi

Justiça: Adolescentes usuários e dependentes químicos no mercado de trabalho

Atualizado: 14 de jan. de 2020

Opinião Justiça

Por:

Profª. Raquel Bunholi - OAB/SP: 315.114.

Prof. Paulo Henrique Boldrin - OAB/SP: 365.105.



A criança e o adolescente têm assegurada proteção especial no ordenamento jurídico brasileiro. De acordo com o art. 227 da Constituição Federal de 1988, é dever da família, da sociedade e do Estado garantir os direitos fundamentais à criança, ao adolescente e ao jovem, além de protegê-los de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Note-se que há necessidade de se observar o princípio da proteção integral à criança e ao adolescente, o que se estende ao Direito do Trabalho. Para o Estatuto da Criança e do Adolescente, considera-se criança a pessoa com até 12 anos de idade incompletos e adolescentes aquela entre 12 e 18 anos de idade.

A proteção do trabalho da criança e do adolescente tem origem na necessidade de se evitar a exploração da mão de obra infantil. Com a Revolução Industrial nos Séculos XVIII e XIX, o trabalho de crianças, de adolescentes e de mulheres foi utilizado na produção fabril como forma de reduzir o custo da mão de obra, pois normalmente eram pagos salários bem inferiores aos dos homens adultos. Além disso, essas pessoas ficavam sujeitas às condições degradantes de trabalho, com elevadas jornadas, ausência de concessão de intervalos, descansos e férias e submetidos ao contato com substâncias nocivas à saúde. Como forma de se evitar essa exploração, a legislação foi sendo modificado ao longo dos anos, trazendo diversas normas protetivas.

No ordenamento jurídico brasileiro, a proteção do trabalho da criança e do adolescente é prevista no art. 7º, XXXIII, da CF/88 que proíbe o trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos trabalhadores com menos de 18 anos de idade, além de vedar a prática de qualquer trabalho aos menores de 16 anos, salvo se forem contratados como aprendizes, a partir dos 14 anos. Em resumo, a Constituição Federal traz as seguintes previsões:

a) Proibição de qualquer trabalho às crianças e adolescentes com menos de 14 anos de idade;

b) Os adolescentes com idade entre 14 e 16 anos somente poderão trabalhar na condição de aprendizes. A partir de 16 anos, poderão ser contratados como empregados normalmente;

c) As crianças e adolescentes com menos de 18 anos não podem trabalhar em atividades noturnas, insalubres e perigosas.

A aprendizagem é uma forma especial de contratação que exerce a importante função de permitir a capacitação profissional e a integração de jovens entre 14 e 24 anos no mercado de trabalho. A limitação de idade não é aplicada ao aprendiz com deficiência. O aprendiz é empregado e, portanto, estão presentes os requisitos essenciais da relação de emprego. No entanto, há diversas exigências na CLT para a validade desse contrato. Nesse sentido, exige-se que o contrato seja escrito, que haja matrícula e frequência do aprendiz na escola, caso não tenha concluído o ensino médio e a inscrição em programa de aprendizagem com formação técnico profissional.

Na tentativa de incentivar a contratação de aprendizes para a inserção de novos profissionais no mercado, o art. 429 da CLT prevê a necessidade de as empresas contratarem aprendizes no percentual de, no mínimo, 5% e, no máximo, 15% do quadro de trabalhadores.

Sobre o tema, no dia 05/06/2019, foi promulgada a Lei nº 13.840/2019 que modificou diversos artigos da Lei de Drogas. Houve a modificação no Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD) e na oferta de vagas a aprendizes. Esse sistema tem o objetivo de prevenir o uso indevido das drogas, auxiliar na reinserção social de usuários e dependentes e na repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de entorpecentes. A legislação estabelece como um de seus princípios, o estímulo à capacitação técnica e profissional e à edição de políticas voltadas à educação continuada e ao trabalho.

Essa lei acrescentou o § 3º ao art. 429 da CLT para prever que as empresas poderão ofertar vagas de aprendizes a adolescentes usuários do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD por meio de instrumento de cooperação celebrados entre as empresas e os gestores responsáveis pela prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas. Portanto, para o preenchimento da cota de aprendizes, os empregadores poderão se valer de adolescentes usuários do SISNAD.

Ressalta-se que essa previsão legal é fundamental para a proteção do adolescente e para sua reinserção social por meio do trabalho. Tendo em vista que o adolescente usuário de drogas pode ter dificuldades de encontrar um emprego ao ingressar na vida adulta, os programas de aprendizagem podem ser um importante instrumento para a sua capacitação técnica e para a aquisição da experiência exigida para o trabalho. No entanto, essa medida somente será eficaz se houver estímulo às empresas para a contratação.

Uma possível solução seria a implementação da chamada cota social de aprendizagem para esses adolescentes. Essa medida é utilizada principalmente por empresas que têm dificuldade de contratação de aprendizes, por desenvolverem, por exemplo, atividades insalubres e perigosas. Nesse caso, a empresa contrata o aprendiz e paga todas suas verbas trabalhistas, mas o trabalho do aprendiz é desenvolvido em órgãos públicos e organizações da sociedade civil. Desde que direcionada à atuação estatal, é possível a adoção de medidas para a reinserção de adolescentes e usuários de drogas no mercado de trabalho, o que vai ao encontro do princípio da proteção integral previsto na Constituição Federal.

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