Opinião Justiça
Raquel Bunholi - OAB/SP: 315.114.
Paulo Henrique Martinucci Boldrin - OAB/SP: 365.105.
Liberdade de expressão: quando o limite pode ser o bom senso
Autora: Sílvia Selli
Aluna do Curso de Direito da Faculdade Anhanguera de Sertãozinho/SP.
Liberdade de se expressar, ou simplesmente, liberdade de expressão, é um direito previsto na Constituição Federal de 1.988, no artigo 5º, inciso IV, onde temos: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. Com isso, é fácil compreender que podemos manifestar o nosso pensamento, somos livres para dizer o que pensamos em uma conversa entre amigos, em vídeo ou publicações em redes sociais tais como Facebook, Instagram, YouTube, locais onde facilmente podemos publicar, dada a facilidade de aplicativos para uso no celular.
Mas será que podemos fazer isso deliberadamente, de qualquer maneira, como coisas do tipo: “ah, eu penso assim”, e pronto? A resposta é não! Mas aí podem se perguntar o porquê, se vivemos em um País laico, em que a mídia não é regulada pelo Estado e a isso podemos entender como direito de falar e de calar.
Isso tudo não é muito difícil de entender, mas precisa de alguns cuidados e um olhar atento. Somos livres para manifestar nosso pensamento e nossa vontade, seja de forma escrita, seja de forma falada (entre as pessoas em uma conversa formal ou informal, ou em mídia gravada, como um vídeo), mas devemos nos atentar ao conteúdo e à forma como o assunto em pauta é tocado e desenvolvido.
O fato de estarmos manifestando nossa vontade, nosso pensamento, não nos dá o direito de agredir verbalmente as pessoas, muito menos de ofender como pessoa (seja por questão social, racial, religiosa, de gênero, nacionalidade, entre outros), pois, da mesma forma que temos liberdade, temos responsabilidade quanto ao conteúdo ou assunto que focamos, mas também a forma como nos expressamos, que deve ser de maneira respeitosa, levando em conta o alcance que tal conduta pode ter.
Outro ponto importante é a questão de ser vedado o anonimato. Mas o que isso significa? Simples: como regra, o que for exposto deve ser assinado, deve-se saber quem criou tal documento. Mas, há exceções como, por exemplo, se uma pessoa corre risco de morte, mas precisa fazer uma denúncia.
De fato, chegar a um meio termo, em que se diga o que sente a respeito de algo é muito difícil quando tratamos de emoções, tendo em vista que nem sempre conseguimos ou podemos controlar uma indignação diante de algo que nos machuca ou ofende, e mais, quando é atacado veementemente o que acreditamos ou pessoas que amamos.
O ideal é pensar bem, deixar a raiva passar, e depois falar. Procurar entender e se colocar no lugar do outro (mais fácil falar do que fazer, eu sei), também evita muito desentendimento e “dores de cabeça”, pois dependendo do conteúdo, as consequências podem se estender à esfera jurídica.
Falar sem pensar pode custar caro se o ofendido resolver procurar a justiça, já que as consequências podem alcançar a esfera penal. Sim, temos previstos no Código Penal, a difamação (ofensa à reputação) e a injuria (ofensa à dignidade), previstos respectivamente nos artigos 139 e 140 do Código Penal Brasileiro. Estendendo um pouco mais, dependendo do alcance que tiver, e o conteúdo de que for falado, até mesmo o Ministério Público pode tomar providências legais.
Com tudo isso, percebe-se que na mesma proporção em que temos o direito de dizer o que pensamos, de dar nossa opinião sobre alguém, ou alguma coisa, também temos responsabilidade sobre o que estamos divulgando, o peso e a importância que tem e a quantidade de pessoas que tomam conhecimento.
Recentemente, uma produção do grupo “Porta dos Fundos”, causou certo alvoroço em nosso país, dividindo opiniões, não só no conteúdo, mas também quanto à manifestação da justiça a respeito.
No filme em questão, a polêmica gira em torno da forma como foi retratada a orientação sexual de Jesus, a postura de Maria e de outros personagens bíblicos, o que dividiu opiniões: de um lado houve quem defendeu, tendo em vista a crítica artística dentro do assunto, a liberdade de se expressar, de retratar algo com outros “olhos”. Mas por outro lado, há quem interpretou de forma agressiva, atingindo diretamente a fé cristã, tendo em vista que segundo esta, estaria deturpando a figura de Jesus Cristo, ofendendo a fé de quem segue esta religião, ou mesmo que acredita na figura sagrada, também presente em outras religiões e doutrinas. Dada a repercussão que teve, a manifestação direta da população que repudiou tal ato e as últimas notícias a respeito disso, é que a justiça no Rio de Janeiro, por meio do desembargador Dr. Benedicto Abicari, determinou que a plataforma Netflix suspendesse de forma imediata o acesso a tal produção, logo após ataque que foi feito à produtora, decisão esta que já foi derrubada pelo STF.
Mas então, como podemos saber os limites para nos manifestarmos, até que ponto é ofensivo ou é direito? Diria que o termômetro é o bom senso. Ainda que seja verdade o que queremos falar, temos por obrigação tratar do assunto com respeito, nos colocar no lugar do outro (missão quase impossível) e medir as palavras, por mais difícil que seja, ou então, no pior dos pesares, estar preparado para as consequências.
Bibliografia
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BEZERRA, Juliana, Liberdade de Expressão, publicado e disponibilizado no site: https://www.todamateria.com.br/liberdade-de-expressao/
NEVES, Felipe Costa Rodrigues, CORTELLINI, Isabel, Liberdade de expressão em tempos de internet, publicado em, 14 de setembro de 2018, disponibilizado em: https://www.migalhas.com.br/ConstituicaonaEscola/123,MI287487,51045-Liberdade+de+expressao+em+tempos+de+internet
LENZI, Tié, Significado de Liberdade de expressão, atualizado em: 13 de julho de 2019, publicado e disponibilizado em: https://www.significados.com.br/liberdade-de-expressao/
MERELES, Carla, LIBERDADE DE EXPRESSÃO E LIBERDADE DE IMPRENSA: QUAIS AS DIFERENÇAS?, publicado em: 24 de março de 2017, disponibilizado em: https://www.politize.com.br/liberdade-de-expressao-liberda
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